sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Hits de "world music/new age" dos anos 90

por Paulo Neto

Em meados dos anos 80, houve um interesse sem precedentes na música étnica que se fazia um pouco por todo o mundo, criando um movimento daquilo a que se convencionou chamar world music ou new age. Um dos factores para o crescimento desse movimento residia numa resposta à constante uniformização e industrialização da música popular, buscando sonoridades mais genuínas. Porém, foi ainda nos anos 80 que se descobriu que, com a produção certa e um travo de pop, uma canção cantada numa língua obscura poderia ser um êxito global. Os casos mais marcantes foram "Yeke Yeke" do malinês Mory Konté e "Im Nin' Alu" da israelita (já tragicamente falecida) Ofra Haza.
Chegados à década seguinte, vimos vários casos de hits internacionais que misturavam pop com sonoridades invulgares, por vezes cantados em línguas pouco conhecidas. Analisemos seis exemplos marcantes.

Deep Forest é um projecto de dois produtores franceses, Michael Sanchez e Eric Mouquet. O tema mais conhecido do colectivo, "Sweet Lullaby", data de 1992. A parte vocal é um cântico Baegu intitulado "Rorogwela", oriundo das Ilhas Salomão. Esse registo foi gravado em 1970 por um etnomusicólogo alemão e a voz que se ouve é atribuído a Afunakwa, oriunda da ilha de Malaita, que terá falecido em 1997 ou 1998. 
 Mas julgando pela letra, esta canção de embalar é tudo menos doce, já que é sobre um pequeno órfão a ser confortado pelo irmão mais velho após a morte dos pais deles. Ainda assim, o tom encantatório da parte vocal aliado ao som de panpipes provou ser uma combinação eficaz, e o tema conquistou os tops um pouco por todo o mundo. Existem dois videoclips: um com uma mãe africana e o seu filho a caminharem por um extenso areal de dunas e outro realizado por Tarsem Singh, mostra uma menina a passear pelo mundo no seu triciclo para acabar embalada nos braços da sua mãe.
   

Os Deep Forest continuam no activo, com o último álbum editado de 2008. A sua música foi utilizada por filmes como "Prêt-A-Porter" e "Estranhos Prazeres" e colaboraram com artistas como Peter Gabriel, Jon Anderson, Cesária Évora, Youssou N'Dour, Ana Torroja e Josh Groban. Em 1995, venceram o Grammy para Melhor Álbum de World Music com o álbum "Bohéme". 


Os Enigma são um dos projectos mais conhecidos deste tipo de música. Mentorizado pelo romeno-germânico Michael Cretu (durante longos anos casado com a popstar Sandra), já em 1991, tinham tido um êxito à escala mundial com "Sadness Part 1" que misturava batidas dançáveis com cânticos monacais. (Aliás,  foi também nos anos 90 que coros de monges gregorianos tornaram-se campeões de vendas!) No álbum seguinte dos Enigma em 1994, o grande destaque foi para o tema "Return to Innocence". O célebre cântico que domina a canção é um sample de "Jubilant Drinking Song", um cântico aborígene da ilha de Taiwan. Igualmente célebre é o videoclip onde se vê a vida de um homem a andar para trás.

Michael Cretu utilizou o sample, acreditando que se tratava de um cântico de origem popular, e por isso sem direitos de autor. Só que afinal o trecho estava atribuído a dois músicos taiwaneses aborígenes, Kuo Ying-Nan e Kuo Hsiu-Chu, que processaram Cretu em 1998. Acabaram por chegar a um acordo pecuniário fora do tribunal e os dois Kuo desde então são creditados pelo tema e têm direito a uma parte dos royalties. E como é sabido, os Enigma ainda seguem no activo.

Também de 1994, o álbum "In Existence" do projecto Beautiful World, liderado pelo inglês Phil Sawyer, músico e produtor envolvido em vários grupos rock nos anos 60, que desde os anos 80 produzia música para documentários e anúncios publicitários. Portugal foi um dos países onde o álbum teve mais sucesso, chegando a disco de ouro, destacando-se a faixa-título, cantada em swahili.


O projecto Beautiful World editou mais três álbuns, o mais recente em 2007.


Com tantos cânticos vindos de sítios recônditos a tornarem-se hits internacionais, era uma questão de tempo até haver algum êxito com cantares índios nativo-americanos. E lá surgiu em 1995, pelo comando do colectivo alemão Sacred Spirit. "Yeha-Noha" era cantado no idioma Navajo pelo ancião Jake Kee Chee. A letra fala sobre uma lenda em que os animais diurnos e nocturnos disputavam um jogo em que quem encontrasse uma bola, ganharia o direito a haver dia ou noite permanente. O single foi n.º 1 em França.

O projecto Sacred Spirit também continua no activo mas desde 2003 que trocou os cantos índios pelas remisturas e adaptações de temas jazz e blues.

O hino do Natal de 1995 foi "Nirvana" do projecto espanhol Elbosco. O vídeo foi filmado na Índia, embora o tema seja cantado em inglês e latim, sendo o refrão cantado pelo jovem coro da Escolanía del Real Monasterio of San Lorenzo, por rapazes de 9 a 14 anos. O álbum "Angelus" foi n.º 1 em Espanha e Portugal. 



O projecto produziu mais um álbum "Virginal", de 1997.

A nossa viagem termina em 1998 (se bem que a edição original seja de 1996), com o colectivo francês Era, comandado pelo Eric Levi, e o famoso "Ameno" a fazer furor no nosso país. O álbum chegou ao n.º 1 do top e foi disco de platina. Mais uma vez, o público deixou-se seduzir por cantos pseudo-monacais em pseudo-latim. Este remix dançável também ajudou ao sucesso.

 


O projecto Era continua bem activo, tendo editado em 2010 o seu oitavo álbum. 












  





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5 comentários:

  1. No cromo "Músicas históricas que são enigmas":
    "A menina Lú, antena linda"
    E isso do "Divano":
    Viva la o
    Viva la obe
    Viva la obesi
    Viva la obesidad

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    Respostas
    1. E do "Ameno":
      Mondegreen:
      Mandelo, mandelo y corre
      Mandelo por e-mail
      Mandelo por e-mail

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    2. LOL 'mondegreen' é espectacular :D

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    3. é verdade!
      O Cromo é o 591: http://podcastmcr.clix.pt/rcomercial/cdc02_300311.mp3

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  2. Será que o som "Fata Morgana" da banda alemã Dissident cabe nessa onda também?

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